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Centro de encontros: Passeio Público era um pequeno oásis de calmaria em meio ao tumulto

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Centro de encontros: Passeio

A quarentena deu tempo pra pensar. É clichê, mas não é mentira. Sobrou tempo pra pensar até no que a gente não queria, ou preferia esquecer. Deu tempo de lembrar daqueles momentos de pé sob o sol do meio-dia, em pleno Centro da cidade, esperando ou tentando resolver alguma coisa. Na hora, ninguém queria de fato estar ali, mas quando se vê impedido de viver a rotina – inclusive suas mazelas -, admito, bate até saudade.

Pra gente, que é jornalista, estar no Centro é testemunhar encontros e desencontros alheios, de propósito ou ao acaso. Observar faz parte da profissão, e certos lugares são “prato cheio” para isso – como a Praça do Ferreira. Aquele quadrilátero certamente reúne mais histórias do que qualquer um de nós seja capaz de contar, e pode ter certeza que a cada 10 jornalistas de Fortaleza, pelo menos sete têm algum relato pronto para narrar, vivido na praça.

Seguindo pelas ruas vizinhas, era fácil se esquivar rápido o bastante pelo vai-e-vem de pessoas para chegar em poucos minutos na Cidade da Criança, ou Parque da Liberdade, se a memória for mais longe. Lá dentro, as pequenas esculturas de anjos mantinham o ar de inocência que pairava por trás das grades, entre cada banco. Como tantos outros espaços do bairro, a Cidade padeceu com as marcas do tempo e do descaso, mas resiste para a chegada de cada visitante que se dispõe a apreciar. É assim que espero encontrá-la na próxima vez.

Pela saída de trás do parque, uma caminhada em linha reta pela Rua Sena Madureira leva até a Igreja da Sé, imponente que só ela. Que outra construção na cidade, ao ser avistada de qualquer janela mais distante, te faz apontar e constatar (em voz alta, pra dar mais efeito): “olha ali, dá pra ver a Catedral daqui!”? Não é preciso ser católico para se impressionar e sentir a necessidade de parar para admirá-la, ou acompanhar com o olhar enquanto passa de ônibus, carro ou bicicleta. A Catedral é uma parte do coração do Centro, e de Fortaleza também.

Da Igreja, o trajeto é curto até chegar ao Paço Municipal. O espaço não carrega o mesmo simbolismo, mas, para mim, já foi palco de muitos reencontros. Os colegas de profissão talvez concordem. Era lá, em coletivas de imprensa, que a gente via rostos familiares da faculdade, mais frequentes nas telas da rede social do que na vida real. É trabalho, mas é vivência também. Disso, sinto falta.

A paz que sempre encontrei nos corredores do Passeio Público também faz falta. Um pequeno oásis de calmaria em meio ao tumulto. Dali, avistar o mar abrigada na sombra das árvores dava um vislumbre do que Fortaleza tem de melhor a oferecer. Da última vez em que passei pela Praça dos Mártires, antes da pandemia, o espaço estava sendo reformado. Foi interditado. Nesses últimos quatro meses, creio que muitos sentiram como se estivessem na mesma situação.

Assim, decido que na próxima vez em que puser os pés no Centro, sem medo nem máscara, não haverá tempo para reclamações. Vou honrar o reencontro, e nenhum sol do meio-dia, quarteirão a percorrer ou multidão entre a qual se misturar farão com que a experiência seja menos gloriosa. O Centro é o coração de Fortaleza, e é um pouco do meu, também.

Diário do Nordeste

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