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Nas mãos da Câmara um eventual processo criminal ou impeachment de Temer

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Além de possivelmente vir a enfrentar um pedido de impeachment, o presidente Michel Temer pode ter que responder também a processo criminal, de acordo com juristas ouvidos pelo EL PAÍS, caso a denúncia de que tentou obstruir a Operação Lava Jato se confirme. Segundo informações do jornal O Globo, o peemedebista teve uma conversa gravada por Joesley Batista, da holding J&F, dona da JBS, na qual ele teria dado o aval para que o empresário comprasse o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha. “Tem que continuar com isso aí”, disse Temer, ainda de acordo com o jornal.

Batista estaria negociando um acordo de colaboração com a Justiça. Apesar da imunidade em função do cargo que ocupa — o que impede que ele seja alvo de processo por fatos sem ligação com o mandato — Temer pode ser processado por qualquer crime comum cometido quando ele é presidente. Para que isso ocorra basta que a Procuradoria Geral da República apresente uma denúncia formal, e que dois terços da Câmara dos Deputados votem favoravelmente pelo andamento da ação. Em seguida, caberia ao Supremo Tribunal Federal aceitar ou não a acusação feita pelo Ministério Público e posteriormente julgar o caso.

A conversa entre Temer e Joesley Batista ocorreu, segundo O Globo, no último 7 de março. O crime que teria sido cometido fica fora, por consequência, da imunidade que a Constituição confere ao presidente para “atos estranhos ao exercício da sua função”.

O artigo 86 da Constituição afirma que “admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terços da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, ou perante o Senado Federal, nos crimes de responsabilidade [que justificam abertura de processo de impeachment]”. Até o momento a Procuradoria Geral da República não confirma nem desmente a existência das gravações de Joesley.

Se a Câmara votar para que o presidente seja processado criminalmente e o STF aceitar a denúncia, ele seria afastado do cargo. Caso o julgamento não seja concluído em até 80 dias, ele retorna às suas funções no Planalto, mas o caso continua tramitando. Não existe o tipo penal de obstrução da Justiça no Brasil, mas Temer pode ser enquadrado na Lei de Organizações Criminosas, com pena prevista de três a oito anos de reclusão. “Incorre [em crime]quem impede ou, de qualquer forma, embaraça a investigação de infração penal que envolva organização criminosa”.

Com relação a um processo de impeachment, caberá ao presidente da mesa diretora da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que é alvo de inquérito na Lava Jato, aceitar o pedido. O deputado Alessandro Molon (Rede-RJ) afirmou, nesta quarta-feira, que já protocolou um requerimento de afastamento de Temer. “Esse pedido de manutenção de pagamento de propina a Eduardo Cunha para que ele mantenha seu silêncio. Isso fere direta e claramente a lei dos crimes de responsabilidade, sobre comportamento inadequado ao decoro do cargo”, afirmou o deputado. Junto com colegas petistas, Molon voltou a defender eleições diretas. “Esse Congresso não tem condições de escolher um presidente”, disse. Caso o impeachment de Temer seja aprovado, caberia, de acordo com a lei, ao Congresso escolher um substituto em eleições indiretas.

Temer, velho conhecido da Lava Jato

Até agora o nome de Temer já havia aparecido em alguns episódios da Lava Jato. De acordo com Janot, nas delações da Odebrecht surgiram indícios de que Temer “capitaneava” um esquema de captação de propinas para o PMDB quando ele era vice-presidente. Dois ministros do atual governo, Eliseu Padilha, da Casa Civil, e Moreira Franco, da Secretaria Geral da Presidência, teriam pedido “recursos ilícitos” à construtora agindo “em nome do PMDB e de Michel Temer”. O próprio ex-presidente da empreiteira Marcelo Odebrecht e um dos seus executivos, Claudio Melo Filho, relataram um jantar no palácio de Jaburu em 28 de maio de 2014, no qual teriam acertado com Temer e com Padilha uma doação ilegal de 10 milhões de reais para o PMDB.

Márcio Faria da Silva, outro ex-executivo da Odebrecht, também contou aos procuradores da Lava Jato que, em 15 de julho de 2010, se reuniu com o peemedebista em seu escritório no bairro de Pinheiros, em São Paulo. Nesse encontro, que também contou com a presença de Eduardo Cunha, teria sido acertado o pagamento de propinas de 40 milhões de dólares da empreiteira ao PMDB. O presidente divulgou um vídeo nas redes sociais para desmentir a acusação. No entanto, a reunião também foi confirmada pelo próprio Cunha, o homem cujo silêncio Temer teria incentivado que Joesley comprasse.

Em nota, a presidência da República afirmou que “Michel Temer jamais solicitou pagamentos para obter o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha. Não participou e nem autorizou qualquer movimento com o objetivo de evitar delação ou colaboração com a Justiça pelo ex-parlamentar”. Ainda de acordo com a assessoria do peemedebista, ele de fato se encontrou em março com Joesley, mas não tratou de nenhum tema ilegal.

Acionado por deputados da oposição, o plenário do STF deve deliberar em breve — sem data marcada — se o presidente pode ser investigado (e não necessariamente processado, o que seria uma etapa posterior) pelas acusações contra ele feitas por delatores da Odebrecht. O próprio procurador-geral, Rodrigo Janot, em relatório enviado à Corte, considerou que havia motivos para investigar Temer, mas que “por ora” não iria formalizar um pedido tendo em vista a “imunidade temporária que a Constituição confere” ao presidente no caso de atos cometidos antes do seu mandato. O artigo 86 da Carta Magna afirma, no parágrafo quarto, que o “presidente da República, na vigência do seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício da sua função”. Mas outros juristas, entre eles o falecido ministro do STF Teori Zavascki, num despacho assinado há dois anos, defendem que o presidente pode ser investigado enquanto não acaba o seu mandato ainda que seja por atos cometidos antes de chegar ao cargo. A Constituição, segundo essa tese, só impede processa-lo ou puni-lo.

EL PAÍS

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