Ouvir Rádio: Rádio Senado | Rádio Câmara Fale Conosco

16 candidatas, 10 siglas e milhões em movimentações suspeitas

0
O POVO de 12 de fevereiro trouxe primeiro caso de aparente candidatura laranja no Ceará
O POVO de 12 de fevereiro trouxe primeiro caso de aparente candidatura laranja no Ceará

Muita gente não entende exatamente o que há de errado nas candidaturas aparentemente laranjas. Começando do início: quase todos os escândalos políticos no Brasil passam por financiamento de campanha, seja como meio – lavagem de dinheiro de propinas – ou como fim, como abuso de poder econômico para influenciar o resultado eleitoral. Havia as sobras de campanha do esquema PC Farias. Os “recursos não contabilizados” dos mensalões tucano e petista. As propinas milionárias disfarçadas de doações legais de Odebrecht, OAS e tantas outras descobertas na operação Lava Jato. Após todos esses escândalos, a legislação sobre financiamento de campanha mudou. Doações de empresas foram proibidas. Afinal, empresa não vota, não tem cidadania. Tem interesses e faz investimentos. Doações privadas de indivíduos seguem permitidas, mas com limites. Porém, o grosso do financiamento eleitoral passou a ser público. Como a criatividade para delinquir é das matérias-primas mais abundantes do Brasil, logo foram encontradas formas de burlar o novo mecanismo.

Diferentemente dos consideráveis fluxos de dinheiro para partidos, presentes no mensalão, ou das propinas milionárias da Lava Jato, o abundante laranjal que brotou no Brasil é um trambique típico de baixo clero, embora alcance alguns grandes partidos. Não é esquema sofisticado e de amplo alcance. É das típicas tramoias da periferia do poder. Veio à luz no PSL justamente porque o partido era isso: baixo clero, sigla que operava longe dos holofotes. Ao ganhar projeção, ganhou visibilidade e cobrança. Jogo jogado. Quando estava no poder, o PT era mais vigiado e queria que a mesma atenção fosse dada ao PSDB. A realidade é que quem está no governo tem mais atenções. Por razões simples: no exercício do cargo, o crime ocorre em flagrante. É o dano ocorrendo no momento, e cuja continuidade pode ser evitada. Não havia razão para o PT chorar antes, nem para Jair Bolsonaro (PSL) se queixar agora.

Ocorre que o esquema vai muito além do PSL. Os repórteres Carlos Mazza e Igor Cavalcante mostraram, no O POVO de ontem, que pelo menos dez partidos fizeram movimentações financeiras esquisitas, só no Ceará. Na lista estão o gigante MDB, o PSDB, o PDT dos Ferreira Gomes, maior partido do Ceará. O Pros, partido do Capitão Wagner, também integra a lista, conforme O POVO vem mostrando há semanas. E há o PRB, partido da Igreja Universal. Fecham a relação PSB, PR, PTB, PMN e Avante.

Não que todas as situações sejam irregulares. Mas, são suspeitas. Trata-se de parcela do fundo partidário que só poderia ser destinada a candidatas mulheres. A lei estabelece o mínimo de 30% das candidaturas para cada sexo. Não pode haver mais de 70% das candidaturas de um partido só de homens. Nem só de mulheres. A distribuição do dinheiro deve obedecer a essa proporção. Ou seja, para garantir o mínimo de representatividade entre os sexos, as candidaturas não devem ser preenchidas apenas para constar e serem deixadas à míngua. Cada sexo tem um mínimo de recursos a receber, para garantir o mínimo de competitividade.

Há indícios de que isso foi burlado. Algumas candidaturas foram inscritas para constar. Receberam o dinheiro, mas elas próprias não usaram. Os recursos eram aplicados de outras formas. Verba pública. Desviada para outras candidaturas ou mesmo gastos aparentemente de fachada. Sabe-se lá onde esse dinheiro foi dar. Novamente, uma maneira de fraudar o financiamento de campanha. Dessa vez, o dinheiro não é das empreiteiras. É público, o que torna pior a situação.

Respostas oblíquas

Millôr Fernandes ensinava sobre jornalismo: “O direito de resposta é uma coisa fundamental. Sagrada. Senão a gente fica até imaginando que o outro lado pode ter razão”. É o caso do laranjal. Algumas das coisas mais interessantes e comprometedoras foram ditas pelos próprios envolvidos ao O POVO. Candidatas diziam que tinham recebido menos dinheiro do que consta na prestação de contas. Dirigentes partidários desconheciam valores e até mesmo a existência de candidata que recebeu centenas de milhares de reais. Espanta-me que partidos sejam tão dadivosos com dinheiro. Dinheiro público, tudo bem. Mas, ainda dinheiro. E que tratem a ponto de distribuir a quem nem conhecem nem tem voto.

Mas, bom mesmo foi quando Doutora Zuila (MDB) foi questionada pelo O POVO sobre os R$ 375 mil repassados a ela. “Eu recebi isso aí? Eu recebi isso aí? Você tá.. (risos) você tá muito mal informado, viu (risos)”, reagiu, negando a informação oficial do TSE. Confrontada com os dados, ela finalizou: “A minha campanha foi óoootima”. E desligou na cara do repórter.

opovo

Compartilhe

Deixe um comentário