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8 em cada 10 crianças e adolescentes no Ceará vivem na pobreza, diz relatório da Unicef

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Levantamento levou em conta dificuldades ou falta de acesso à educação, renda, informação, água, saneamento e moradia. Documento defende priorização de políticas públicas para estes públicos.

A cada dez crianças e adolescentes no Ceará, oito viveram alguma dimensão da pobreza em 2022. Isso quer dizer que 80% deste público no estado teve dificuldades ou falta de acesso a pelo menos um dos direitos básicos: educação, renda, informação, água potável, saneamento e moradia. O levantamento é do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).

No Ceará, as maiores carências estão relacionadas ao saneamento básico e à renda. As privações para estes dois componentes atingem mais da metade das crianças e dos adolescentes.

Os dados são do relatório “Pobreza Multidimensional na Infância e Adolescência no Brasil”, divulgado pelo Unicef nesta terça-feira (10). O documento analisa resultados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PnadC) Anual, contemplando os anos de 2016 a 2022.

Esta análise permite acompanhar as dimensões da pobreza que vão além da renda e que impactam na qualidade de vida deste público, explanou Santiago Varella, especialista em Políticas Sociais do Unicef no Brasil, durante entrevista coletiva.

Crianças e adolescentes de 0 a 17 anos com privações de direitos no Ceará – 2022

  • Informação: 4,09%
  • Educação: 8,28%
  • Água: 9,4%
  • Moradia: 9,48%
  • Saneamento: 50,12%
  • Renda: 56,41%
  • Total (pelo menos uma das privações acima): 80%

 

O índice sobre o saneamento básico revela a situação de ausência ou precariedade de acesso a banheiros ou redes de esgoto.

Segundo Varella, esse é um dos direitos básicos violados com mais frequência dentre os acompanhados no estudo, sendo um desafio de difícil mitigação por envolver investimentos em infraestrutura.

“Em geral, a literatura (acadêmica) comenta que essa é uma violação extremamente relevante porque dela derivam outras violações, como as privações de saúde para as famílias, com reflexo em todo o resto da qualidade de vida, desde o desempenho educacional até o bem-estar psicoemocional”, comentou o especialista.

 

Privações extremas

 

As privações extremas de direitos revelam a falta de condições básicas, como renda para se alimentar — Foto: Fabianede Paula/Sistema Verdes Mares

As privações extremas de direitos revelam a falta de condições básicas, como renda para se alimentar — Foto: Fabianede Paula/Sistema Verdes Mares

O levantamento também detalha os índices separando as privações intermediárias e extremas. Como explica Varella, as privações intermediárias apontam a baixa qualidade de acesso a um direito, enquanto as extremas revelam a falta de acesso.

No Ceará, o cenário de privação extrema é mais relevante para o acesso à renda. Para este item, é levada em conta a pobreza monetária extrema: quando a renda familiar resulta em menos de R$ 220 mensais por pessoa nas áreas urbanas e R$ 180 nas zonas rurais.

Dimensões da pobreza infantil

Direito Privação intermediária Percentual de crianças e adolescentes no Ceará (2022) Privação extrema Percentual de crianças e adolescentes no Ceará (2022)
Educação Frequenta escola, mas com atraso ou analfabetismo. 5,99% (4-17 anos) Não frequenta escola. 2,29% (4-17 anos)
Informação Não teve acesso à internet no último ano em casa, mas tinha uma televisão em casa. 3,69% (9-17 anos) Não teve acesso à internet no último ano em casa nem tinha uma televisão em casa. 0,40% (9-17 anos)
Moradia Mora com até quatro pessoas por dormitório, com paredes e teto de material inadequado (ex.: madeira aproveitada) 6,03% Mora com mais de quatro pessoas por dormitório, ou com paredes e teto de material inadequado (ex.: madeira aproveitada) 3,45%
Água Mora em casa servida por água canalizada somente no terreno/ área externa à propriedade. 4,70% Mora em casa que não receba água canalizada. 4,70%
Saneamento Mora em casa com banheiro compartilhado com pessoas de fora do domicílio ou com fossa rudimentar. 44,09% Mora em casa sem banheiro ou com vala a céu aberto. 6,03%
Renda Tem renda familiar abaixo da linha de pobreza monetária (R$ 540 mensais por pessoa nas áreas urbanas e R$ 386 nas áreas rurais) 38,85% Tem renda familiar abaixo da linha de pobreza monetária extrema (R$ 220 mensais por pessoa nas áreas urbanas e R$ 180 nas áreas rurais). 17,56%

Acompanhamento no Brasil

 

Em geral, as condições de acesso aos diretos tiveram tímidas melhorias no Brasil. O relatório da Unicef mostra que 60,3% das crianças e adolescentes vivenciavam alguma dimensão da pobreza em 2022. Este índice era de 66,1% em 2016.

Um dos pontos de alerta é o dado de analfabetismo: as taxas de crianças entre 7 e 9 anos que não sabiam ler quase dobraram depois da pandemia.

Dentre outros pontos, o levantamento mostra que:

  • Mesmo com a pandemia, o Brasil conseguiu reduzir de forma lenta a maioria das privações de direitos para crianças e adolescentes.
  • Em geral, o componente da informação foi o que mais ajudou na queda do índice geral. A privação era de 14% em 2019, caindo para 6,1% em 2022. Este direito revela as condições de acesso à informação pela conexão com a internet e a televisão.
  • Em 2022, 36% de crianças e adolescentes tiveram privação de renda. Essa pobreza monetária tinha o índice de 40% em 2019. Dentre os fatores, estão medidas como o auxílio emergencial na pandemia e a ampliação dos programas de transferência de renda.
  • Houve piora no acesso à renda necessária para se alimentar: enquanto 19% não tinha esse acesso em 2019, o percentual chegou a 20% em 2022. A alta no preço dos alimentos é um dos fatores envolvidos.

 

De acordo com Santiago Varella, é importante que municípios, estados e o governo federal incluam a infância e a adolescência como prioridade nas políticas públicas e nos orçamentos, contemplando olhares intersetoriais para combater as diversas faces da pobreza.

O especialista aponta que há boas sinalizações nesse sentido a nível nacional, como as prioridades de alfabetização propostas de plano plurianual do Ministério da Educação (MEC) e as obras de infraestrutura que devem entrar no novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Como pontua, a sociedade deve acompanhar e cobrar a efetivação dessas diretrizes e a formulação de políticas que atendam as necessidades mapeadas para a infância e a adolescência.

G1 CE

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