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Questão de sobrevivência

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Muita gente não entendeu o porquê de o PT ir contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e a favor de Aécio Neves (PSDB) na decisão que afastou o tucano. O partido, na verdade, reafirmou posição que já havia adotado na época da prisão de Delcídio do Amaral. Em relação a Aécio, há mais que coerência. O partido sabe que foi com ele ontem e pode ser de novo amanhã. Pelo menos seis dos nove senadores do partido são investigados ou tiveram algum tipo de menção na Lava Jato: Humberto Costa, Jorge Viana, Lindbergh Farias, Fátima Bezerra, Paulo Rocha e até a presidente nacional petista, Gleisi Hoffmann (foto).

MARCOS OLIVEIRA/AGÊNCIA SENADO
MARCOS OLIVEIRA/AGÊNCIA SENADO

A SUSPEITA DO MINISTRO

A decisão do STF sobre Aécio Neves foi estranha. O tucano não teve prisão decretada. Isso só poderia ocorrer em caso de flagrante por crime inafiançável. Ainda assim, a decisão precisaria ser submetida ao Senado. Porém, ele está impedido de sair de casa a noite. Muito parecido com prisão em regime semiaberto. O ministro autor do voto, Luís Roberto Barroso, justifica que não houve prisão, mas decretação de medida cautelar que, aliás, havia sido imposta antes pelo ministro Edson Fachin e posteriormente revogada. Pode fazer sentido, mas é uma tese polêmica.

Ocorre que, fiel ao seu estilo, o ministro Gilmar Mendes pegou muito pesado com decisões que o contrariam da parte de seus colegas de tribunal. Afirmou que a determinação sobre Aécio se deu porque “a turma começa a poetizar”. Foi mais longe: “Começa a ter um tipo de comportamento, vamos dizer assim, suspeito”.

Comportamento suspeito de uma turma inteira do STF? É insinuação grave vinda de um ministro.

CHAMEGO

Eunício Oliveira (PMDB) recebeu ontem o governador Camilo Santana (PT) no Senado. Na semana passada, quem tinha ido até ele havia sido o prefeito Roberto Cláudio (PDT). O modelo de governança do grupo Ferreira Gomes é fortemente dependente dos financiamentos externos. Que, por sua vez, dependem do Senado. Hoje, portanto, estão nas mãos de Eunício.Ainda não está certo se haverá mesmo aliança entre os dois grupos nas eleições do ano que vem. Os dois lados veem vantagem na possibilidade. O que já há de concreto é que as portas se abriram. Os canais foram desobstruídos. A relação havia deixado de existir com o rompimento em 2014. Com Eunício na presidência do Senado, o governador e o prefeito agiram por pragmatismo. Precisam dele para ter dinheiro.

A necessidade construiu pontes. A liberação de dinheiro que estava emperrado já começou a andar. O pragmatismo pavimenta o caminho para a aliança. As conversas têm se intensificado. Pela frequência, a interlocução entre os grupos já é quase um chamego.

DOUTRINAÇÃO NA ESCOLA

Um dos debates mais toscos travados nos últimos anos no Brasil envolve o “escola sem partido”. Articulado no País inteiro, tenta impedir os professores de apresentarem sua visão de mundo nos conteúdos ministrados. Pelo princípio, Sócrates não poderia ter transmitido seus conhecimentos a Platão, sob pena de ser acusado de doutrinar o filósofo. Até os ensinamentos de Jesus Cristo aos discípulos poderiam ser restringidos pelos fanáticos. 

Ontem, porém, o Supremo, rachado, liberou algo muito mais profundo. Não tratou da forma como os professores ministrarão conteúdos. Abordou, isso sim, a própria grade curricular. A rede pública de ensino poderá permitir que escolas sejam usadas para ensino de religiões específicas. Antessalas das igrejas. Flerta com doutrinação, em seu sentido original.

Uma coisa é a postura dos professores em sala de aula. Não penso que deva valer tudo, mas querer punir quem apresenta sua visão de mundo – inclusive sobre a fé – é violentar a pedagogia. Coisa muito diferente é colocar na grade curricular disciplina voltada para propagar credo A ou B.

Quem defende isso pensa em se valer da influência de sua própria fé para se impor sobre as demais. Eu sou católico, mas espero que essa educação fique à cargo da igreja dos pais que querem levar esse ensinamento aos filhos e das crianças que desejam aprender. A escola não precisa e não pode ser responsável por todos os aspectos da formação.

Fico a imaginar como católicos ou evangélicos reagiriam se, na escola paga com dinheiro público, seus filhos tivessem aulas sobre candomblé, umbanda, espiritismo ou islamismo.

ÉRICO FIRMO

OPOVO

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